Bicho de Rua

Talian, inesquecível amor

Sempre gostei de animais, e, quando criança, na impossibilidade de possuir um cãozinho, acompanhava com os olhos as outras crianças passearem com os seus e rezava pelos que via perdidos ou abandonados

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Sou apenas alguém em cujo coração um pequeno anjo entrou e nunca mais saiu. Sempre gostei de animais, e, quando criança, na impossibilidade de possuir um cãozinho, acompanhava com os olhos as outras crianças passearem com os seus e rezava pelos que via perdidos ou abandonados.
O tempo passou, e a oportunidade não aconteceu. Até que num determinado dia, já adulta, inusitadamente, resolvi entrar na Associação de Proteção aos Animais da minha cidade. Eu acompanhava pela imprensa o trabalho alí realizado, mas naquele dia resolvi entrar e conhecer de perto.

Fui conduzida a um local de onde, por uma janela basculante, poder-se-ia olhar o pátio e os animais que alí estavam, aguardando adoção. E foi assim que a vi. Não era a minha intenção naquele momento, ter um animal de estimação. Com 23 anos, eu fazia faculdade e trabalhava. Morava sozinha, e não sobrava tempo.

Mas ela estava ali. Um animalzinho comum. Acho que São Francisco mandou um emissário que nos tocou, a mim e a ela. Branquinha, com manchas douradas. Pequena e peluda, aquele animalzinho despertou em mim a necessidade urgente de dar-lhe um lar. Saí daquele local com disposição de falar com todos os meus amigos e conhecidos, oferecendo aquele anjo. Ninguém quis, porque não possuía raça definida. Eu nem mesmo sabia o sexo do cachorrinho. Sabia apenas que era especial. Sentia isso.

Dois dias depois, resolvi voltar. Eu não a havia esquecido. Ela estava em uma saleta, com vários outros animais, numa tarde de inverno, trêmula dentro de uma caixinha. Não tive dúvidas. Abracei aquele serzinho e resolvi que seria meu. Era uma fêmea, com aproximadamente 11 anos. Inúmeras pessoas me aconselharam a não adotá-la, por sua idade avançada (talvez em função dela tivesse sido abandonada); os argumentos foram vários: eu sofreria a perda muito rapidamente, teria de me ocupar com doenças, seriam muitas as despesas, etc. Felizmente não lhes dei ouvidos.

Estava resolvido: ela ficaria num hotel durante a semana; nos finais de semana, ficaria comigo, enquanto eu não achasse um apartamento próximo do meu trabalho, o que permitiria que eu fosse em casa, a alimentasse e visse nos intervalos de almoço e antes da aula, à noite. Não era o ideal, mas seria temporário. E assim foi: a cada novo encontro era uma alegria renovada, e a cada despedida, a sensação de tristeza, até que, em algumas semanas, mudei de endereço. E a levei comigo.

Ela chamou-se Talian, e conviveu comigo anos de amizade, companheirismo e muito, muito carinho. Vivemos experiências de troca, de entendimento pelo olhar, de quase telepatia. Dizem que animais adultos (lembrem-se que ela tinha aproximadamente 11 anos quando a adotei) têm dificuldade em assimilar um novo dono, e precisam sempre de guia para conduzir-se. Erro: ela era uma amiga. Não precisava de guia, pois minha voz de comando chegava ao seu coração.

Foram 6 anos de convivência, e se alguém, algum dia, perguntar se me arrependi de passar pela tristeza de perdê-la para a idade e para a doença, eu responderei com toda a segurança de quem muito amou: se viver significa (também) sofrer, mas se junto ao sofrimento vier a gratificação de saber-se amado(a), vale a pena o ônus do sofrimento e da perda, pois a recordação dos momentos vividos será eterna.

Com ela aprendi a ser menos orgulhosa, a dividir sem egoísmo, aprendi a ter paciência e a amar incondicionalmente. Aprendi a guardar silêncio nos momentos certos e ter muita, muita paciência com os seres humanos. E esse amor todo me faz escrever e motivar quem ainda não tem um pet, ou quem conhece alguém que sozinho, necessita de companhia, ou ainda quem, doente, vive entregue à dor e lamento pela falta de saúde: vamos dividir o amor, vamos distrair a depressão doando-nos e recebendo, dividindo nosso tempo e nosso carinho com quem muito necessita desse tempo e desse carinho, não exigindo nada além disso.

A saudade da Talian me acompanhará sempre. Sofri e ainda sofro sua ausência, mas me sinto imensamente feliz por ter vencido as dificuldades, mantido a determinação e vivido a experiência. Hoje, tenho 2 outros cachorros, também amigos e companheiros: o Ted (um poodle, de 10 anos) e a Aína (uma SRD adotada com mais de 6 anos, e que está agora com 16).


Eliana Krug
professora e advogada
dez/2004
(Texto escrito 9 anos após o desencarne da Talian)


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